1º de Maio

Dos mártires de Chicago às lutas do trabalho contemporâneo

Há 139 anos, em Chicago, ocorria a revolta de Haymarket, um marco decisivo para a história da luta des trabalhadores do mundo inteiro. Durante a manifestação que estava inserida dentro da jornada de luta pelas oito horas de trabalho diárias, uma bomba explodiu matando um policia. A polícia em resposta disparou, matando quatro trabalhadores e ferindo centenas. Seguiu-se um processo fraudulento onde acusaram oito militantes anarquistas pela tragédia, condenando sete a morte e outro a 15 anos de prisão. Desses, quatro foram sumariamente enforcados: August Spies, Albert Parsons, Adolph Fischer e George Engel, e um quinto, Louis Lingg, foi assassinado (embora a versão oficial seja suicídio) na prisão. São conhecidos desde então como os Mártires de Chicago, e a sua memória é mantida viva por todo o movimento de trabalhadores. Esta memória também serve para lembrar que as conquistas trabalhistas que ainda usufruimos agora foram conquistadas por muito derramamento de sangue daquelus que vieram antes de nós.

As conquistas dos nossos mártires estão mais do que nunca hoje sob ameaça. Fenômenos como a uberização do trabalho, a precarização das relações trabalhistas, o aumento radical do custo de vida (com o destaque para a habitação), a ascenção da extrema direita e o desmonte das nossas entidades de classe colocam em cheque todas as conquistas das gerações anteriores. Nunca estivemos sob tanta pressão e tão desorganizados.

A uberização do trabalho é uma dilapidação flagrante das conquistas trabalhistas das nossas avós. O estafeta, precário, desenraizado, sem poder de barganha e sem contato direto com o seu patrão, o qual chama pelo título quase-místico de algorítmo, é o protótipo perfeito do novo trabalhador arquitetado pelos bilionários. Para colocar Katy Perry no espaço, somos expostos a jornadas opressivas, ganhando menos a hora que o ordenado mínimo, para depois sermos novamente explorados na nossa subsistência. O capitalismo que se apresenta como um sistema de progresso perpétuo esconde a realidade cruel de que na verdade o nosso trabalho nunca valeu tão pouco. As novas gerações que entram agora no mercado do trabalho não podem nem sonhar em adquirir uma casa própria ou qualquer patrimonio mais durável. Mais ainda, o capitalismo gera cada vez mais desemprego como forma de coerção des trabalhadores para aceitar as condições destes mercados de trabalho. E por isso um dia do trabalhador anti-capitalista deve lembrar a todes o lugar estrutural do desemprego, do sub emprego, do emprego informal no capitalismo.

Essa realidade crua do trabalho atinge principalmente mulheres pobres, pessoas lgbtqia+ e pessoas migrantes racializadas, que são sempre expostas a jornadas dupla de trabalho, trabalhando no emprego e depois no trabalho reprodutivo. O lazer e tempo livre cada vez mais se torna um luxo que poucos podem comprar. Mas não se enganem: ninguém estará a salvo, por mais alva que seja a sua pela, da deterioração geral do padrão de vida dos trabalhadores. A extrema direita, ferramenta do capital, tenta colocar as pessoas brancas e “nacionais” contra as pessoas racializadas e migrantes, culpando-os pela deterioração do padrão de vida, pelo aumento dos preços ou diminuição dos salários. Nunca os bilionários acumularam tanto dinheiro, que é recurso e trabalho, na história da humanidade, e sentem que não estão a acumular o suficiente. Isto por que a ganância deles não tem limites, e pelos seus planos mesquinhos estão dispostos a sacrificar toda a humanidade e a vida na terra.

Frente a estes desafios, temos outro que nos imobiliza, que é o completo desmonte das entidades de classes. Os sindicatos, associações e outras estrtuturas análogas, fruto do acumulo coletivo das classes trabalhadores, sofreram no entanto imensas cooptações e desmobilizações ao longo do século 20, através de ideologias coorporativistas ou que os reduziam a ferramentas deste ou de outro projeto político. A autonomia, a combatividade, a independência de classe, princípios fundadores das lutas des trabalhares, hoje encontram-se muito marginalizados, e a humanidade e a vida pagam como um todo por isso. Frente a esta completa desmobilização, não possuimos as ferramentas necessárias para combater os ataques. Longe de estarmos em um momento de avanço, como estavamos em 1886 quando lutavamos pelas oito horas, estamos agora em um momento de intensa resistência, onde nos seguramos para não perder o pouco que temos.

Precisamos mais do que nunca reconstruir desde a base a nossa resistência! Coletivos, sindicatos selvagens, redes de apoio mútuo, associações de bairro, ocupações, criar novas formas de sociabilidades subversivas, para que possamos não apenas resistir mas avançar para a destruição desse sistema e construção da sociedade que queremos. Essa sociedade não será fruto de grandes mentes ou projetos, mas resultado da luta des de baixo.

1º de maio, do luto à luta! Viva a memória dos mártires de chicago!


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